o riachense

Sbado,
20 de Abril de 2024
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Farinha Marques

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Um dia, à porta do La Gare...

 


1.Aparta-se o pano de boca, abre-se o palco da memória. Ao fundo, sugerindo um quadro de Botelho, uma cortina de Pinto de Campos, figurando o Rossio. Parque Mayer, anos 50. Eugénio Salvador no compére.
Neste contexto chegaremos, a final, ao título desta crónica, onde se fala de um porteiro do La Gare, coito de noctívagos, a entestar com a Estação do Rossio.
Há os que partem, os que chegam, outros que fazem horas. Uns nos copos, alguns no engate.
Sonâmbulos, rufias e boémios. E os que, ainda sem jantar, mendigam o favor de, ao menos, um galão.
O La Gare é a expressão viva, duma cidade que, não sendo já "soturna" e" melancólica", como diria Cesário Verde, convocava uma boa parte da província que, de comboio, aportava ao Rossio para assistir, deslumbrada, ao espectáculo dos reclamos de néon.
Nasceu à sombra da estação de caminhos-de-ferro, edificada em finais do século XIX, a confrontar pelo poente com o luxuoso Hotel Avenida Palace, seu contemporâneo.
O Hotel, que data de 1892, foi pertença da Real Companhia dos Caminhos-de-ferro que concedeu a sua exploração à Wagons-Lits.
A estação, que aparenta o estilo manuelino, serôdio, já se vê, foi construída no sopé de uma colina que desce de S. Roque, ladeando a muralha fernandina apontada à Calçada da Glória. Ao rés-do-chão jaz o Largo do Duque de Cadaval.
O caminho-de-ferro era então factor determinante do desenvolvimento, urbano e rural, e estruturante de um elevado número de vilas e aldeias. São exemplares os casos do Entroncamento, de Casa Branca, Funcheira, Canal Caveira, Setil e tantas outras.
De regresso à estação do Rossio, recordar-se-á que ela constitui hoje um inestimável arquivo de recordações, que preserva a memória da cidade e uma boa parte da história do país.
Ali teve o seu decesso o presidente Sidónio Pais, vítima de um atentado em Dezembro de 1918.
Para ali convergiam as figuras proeminentes da Europa quando demandavam Lisboa.
Eça de Queirós, Mário de Sá Carneiro, Fernando Pessoa, são parte da memória da estação.
"Agora tenho eu que estar à uma menos cinco
Na estação do Rossio, tabuleiro superior – despedida
Do amigo que vai no Sud Express de toda a gente
Para onde toda a gente vai, o Paris...
Tenho de lá estar
E, acreditem, o cansaço antecipado é tão grande
Que, se o Sud Express soubesse, descarrilava" (Álvaro de Campos).
Pessoa, que vinha do Martinho, ali ao lado, detinha-se no La Gare e bebia um tinto... para a escalada até ao tabuleiro superior da estação.

2.À porta do La Gare, grave e sério, postava-se, naquele tempo, Joaquim da Silva Brogueira, natural da Golegã, que foi jornaleiro e cidadão sem mácula.
Ataviado com irrepreensível esmero, de libré, ele era o garante da reserva que a gerência fixara quanto à admissão de clientes no estabelecimento.
Joaquim da Silva Brogueira, jornaleiro de condição, renegou a enxada, em prol de uma vida limpa, debaixo de telha, e foi empregar-se no La Gare onde lhe confiaram, por ser homem probo, o lugar de porteiro.
Joaquim Brogueira exercia, todavia, funções que relevavam das suas próprias de porteiro.
Joaquim Brogueira fazia, outrossim, as vezes de cônsul geral da vila da Golegã na cidade de Lisboa, com assento à esquina da Rua 10 de Dezembro. Agente consular putativo, é claro.
Os patrícios, ajoujados, vergados ao peso das raposas e dos sacos de linhagem onde acomodavam vitualhas e provisões diversas, afloravam, atónitos, à porta neo-manuelina da estação.
Contudo, a um aceno de Joaquim Brogueira, precipitavam-se sobre o passeio defronte do La Gare.
E trocavam abraços e risadas sonoras, genuínas.
As bagagens, essas, ficavam à guarda de Joaquim Brogueira que as acautelava num cubículo, uma espécie de camarim que o patrão lhe destinara nos fundos do estabelecimento.
Esgotado o rol de novidades, quando não de calhandrices, cada qual seguia à sua vida, mediante roteiro sabiamente traçado por Joaquim Brogueira.
Era assim, na verdade, com uma pitada de nostalgia.

Actualizado em ( Sexta, 09 Dezembro 2011 16:52 )  
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