o riachense

Sábado,
04 de Maio de 2024
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Que falta faz um Gil Vicente contemporâneo!

Defina-se, como intróito. 

Não sou militante, sequer simpatizante, do Partido Socialista. As minhas relações com os militantes e simpatizantes locais desse partido, para bem de ambos, assentam na amizade, na fraternidade, ignorando a clubite à portuguesa da ideologia.

Há muito me magoa que a transparência, o respeito democrático, falhassem sempre nas tentativas duma unidade, à esquerda, que fosse alternativa a uma política de direita onde o neo-liberalismo é o slogan dum autoritarismo profundamente conservador e , não se tema a palavra, reaccionário. Mas também não ignoro que as esquerdas partidárias que conheço dificilmente ultrapassam os manuais da ortodoxia. E sinto pena que se cristalizem num sim mas, em relação a um diálogo plural que, fora da ordem de trabalhos das opções partidárias, é defendido duma forma cada vez mais audível por vozes de múltiplas origens, que colocam na lista das prioridades a defesa da liberdade que só a igualdade torna possível.

 Não se é livre para se ser igual, mas é-se igual para se ser livre. A liberdade, só por si, numa sociedade desigual, não ultrapassa o privilégio das elites, que a usam para impedir que os outros a usufruam. A sociedade capitalista é paradigmática dessa pseudo-liberdade , no fundo uma desigualdade onde elites reduzidas monopolizam regalias sociais e privilégios, roubadas ao esforço dos que criam a riqueza das civilizações. O trágico é que são muitas vezes os construtores de civilizações que abdicam dos seus direitos, delegando -os em quem julgam ser capaz de os defender. E o que se verifica, é que essa delegação tem conduzido, quase sem excepções, de forma mais ou menos subtil, conforme a rotulagem utilizada (liberalismo, social-democracia, autoritarismo), a sociedades totalitárias, ou a ditas neo-liberais, assentes ambas no privilégio, na arbitrariedade, na corrupção, no fanatismo, na desumanização. Mais ou menos subtis, porque se a última desrespeita de forma violenta a dignidade humana, as duas primeiras camuflam-se com a lei e a concepção da liberdade democrática para, por manipulação das consciências, manterem a desigualdade social como forma de controlo e exploração civilizacionais, fazendo, no entanto, crer que o voto é a arma do povo. 

Se se verificarem os programas e depois a sua desconcertação durante o tempo em que, quem os propôs, (se ) governa, como criar atempadamente uma alternativa, se o jogo se encontra constitucionalmente viciado, ao retirar aos cidadãos formas de intervenção directa, vigilante, contínua, na vida política? 

Não creio numa democracia sem partidos, mas também não creio que os partidos contemporâneos sejam dos elementos institucionais mais flexíveis e ajustáveis em relação às descobertas da sociologia e psicologia social, da história e da antropologia cultural, e às transformações civilizacionais derivadas das conquistas tecnológicas.

 Ser-se dum partido, nos termos como nos são representados, significa assumir um programa e uma ideologia onde a essência é praticamente imutável, o acordo é uma irmandade de sangue pronta ao que os centros decisores (quase sempre seleccionados e só mutáveis, ou por heresia, ou por morte) deliberarem. Todos os partidos, da direita à esquerda, são, hoje, um espelho reflexo da teoria do centralismo democrático, onde os de baixo votam nos que sobem indicados pelos de cima que nomeiam os que vão subir. E, assim, de forma democrática, se controlam todas as estruturas, desde as de base, as intermédias, aos órgãos de direcção, o tipo de intervenção na sociedade.

Regresso ao início do tema do artigo, por me sentir, como cidadão, ante algo profundamente absurdo: um país em regressão, de praias cheias como um ovo, a alimentar-se de telenovelas, concursos e futebol televisivos, pagando IRS como nunca aconteceu, IVA como nunca aconteceu, impostos directos e indirectos como nunca aconteceu, enquanto as ditas pseudo alternativas ao governo reaccionário e anti-democrático da direita, como o Partido Socialista, se degladiam na praça pública, numa farsa interminável que mereceria um Gil Vicente contemporâneo para fixar num novo Auto das Barcas figuras, jogos, figurões, que, dum e doutro lado, anseiam, (para o usarem como o usaram no passado?), acima de tudo o poder. 

Um povo a corar ao sol, numa pausa da angústia, da revolta e da crise, enquanto a direita abocanha mais bancos, mais créditos, mais impostos, e, como alternativa, pouco mais se vê que protesto, inanição, desconforto, divisão, tribalismo.

Nem um programa de governo, nem um programa de unidade, nem um projecto de esquerda, apenas algumas denúncias da política da direita no Parlamento e protesto organizado nas ruas que, depois dos discursos dos mesmos de sempre, regressam às televisões das telenovelas, dos concursos e do futebol.

 Não tenho a menor dúvida. Não se consegue uma alternativa de unidade sem o Partido Socialista, o Partido Comunista, o Bloco de Esquerda, o Livre, os dissidentes de todos, mesmo sabendo-se, que, sem uma boa barrela, continuarão livres e isentos de pecado muitos que andam há décadas, como acusa Seguro, de mãos dadas com a corrupção; ou como acusa António Costa, ressuscitam e pagam quotas para votar nas próximas primárias desse partido.

Os jogos de poder que por aí andam não são nada saudáveis para um povo que, por rotina e resignação, está habituado, pagando-a, a viver com a doença.

28 de Agosto de 2014
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António Mário escreve sempre às quintas-feiras em www.oriachense.pt

 

Actualizado em ( Quinta, 28 Agosto 2014 10:44 )  
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