o riachense

Tera,
16 de Abril de 2024
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Fidalgos que por aqui passaram

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Carlos Manuel Pereira
 
Um tal António Pires, ao tempo cura da igreja de Santiago, escreveu no primeiro livro de registos paroquiais que existiu nessa freguesia o seguinte: 
“Era do nascimento de Jesus Cristo nosso senhor de 1541 aos 28 dias do mês de dezembro da sobredita era baptizei uma filha, por nome chamada Isabel, de dom Luís e de dona Brites e foram padrinhos um irmão da dita dona Brites e dona Isabel e uma mulher da Golegã parteira e por verdade assinei aqui...” 1
 
Quem é que gostaria de se dizer descendente dum rei, dum fidalgo ou de qualquer outra pessoa importante deste velho reino? A maior parte das pessoas, certamente.
 
Pois bem, vamos a ver quem era este dom Luís. Em dois assentos referentes a óbitos de escravos no Porto e na Quinta da Várzea fica clara a associação de dom Luís de Moura a estas propriedades, bem perto do sítio primitivo dos casais dos Riachos:
“A 4 dias de fevereiro de 1594 anos faleceu francisco escravo de Simão de Miranda da Quinta da várzea que foi de Dom Luís de Moura.”
“Diniz escravo de Simão de Miranda, que comprou a fazenda de Dom Cristóvão de Moura do porto da Várzea, faleceu a 14 de Agosto de 1591 anos. Jaz em o adro diante da porta principal.”
 
A servir de confirmação, o segundo registo refere um dom Cristóvão de Moura, filho de dom Luís e que, por morte deste, terá herdado o porto e a quinta da Várzea para depois a vender, com escravos incluídos, ao Simão de Miranda. Para dramatizar, acrescente-se que o dom Cristóvão era velho conhecido e conselheiro do rei Filipe II de Espanha e que fez tudo para defender a sua coroação como rei de Portugal, após o desaparecimento trágico-cómico do nosso rei dom Sebastião. O rei espanhol nomeou-o seu vice-rei para Portugal e, claro está, os portugueses alcunharam-no de renegado e traidor. 
 
Tudo boa gente... e gente importante... e mais ainda, de acordo com o “site dos fidalgos, queques e betinhos” (http://geneall.net), estes Mouras são descendentes do primeiro rei de Portugal, nem mais nem menos.E quem é que gostaria agora de ser seu descendente? Certamente menos que aqueles que responderam afirmativamente à primeira pergunta. Para ajudar mais alguns a decidirem-se, vou mostrar-lhes um registo que acrescenta algo mais à linhagem destes Mouras:
 
“Aos vinte dias de setembro [de 1545] baptizei eu Domingos Pires, cura da dita igreja, Luísa filha de Jorge, do vedor do paul, e de sua mãe, filha de dom luís de moura, escravos cativos e foram compadres António de Paiva e André Carrolas e Catarina Gonçalves e por verdade o escrevi.” 
 
Apesar de ter acrescentado as vírgulas que não existem no texto original, acho que a leitura se pode tornar difícil. Assim, o cura de Santiago terá baptizado uma criança de nome Luísa, filha de Jorge e de sua mãe, ambos escravos cativos. O vedor do paul2 era o dono do pai da criança e a mãe da criança, cujo nome é omitido, era filha de dom Luís de Moura. Pois é, parece que desta vez o cura resolveu escrever a verdade quase toda... Acrescente-se que em todos os outros registos de baptismos de filhos de escravas era costume mencionar apenas o nome da mãe e o dono desta, por exemplo “... baptizei luís filho de marta escrava de rodrigo de lemos...”, nunca fazendo qualquer referência ao pai da criança.
 
Evidentemente que soa mal dizer que o dom Luís de Moura era dono da própria filha e da neta, mas nesta época os escravos tinham um valor comercial elevado e não se podia desperdiçar a utilização das “fêmeas” para reprodução (isto dito assim ainda soa pior).
 
Quantos mais descendentes destes, meio escravos meio fidalgos, terá o dom Luís deixado por aqui? Não me parece difícil admitir que alguns tenham chegado até aos nossos dias e que, finalmente, alguns de nós sejamos mesmo descendentes de um fidalgo, ainda que por portas travessas, talvez pela porta mais travessa da nossa história, a da escravatura...
1As transcrições foram feitas com ortografia actualizada.
2 O intendente das propriedades que compunham o senhorio do paul do Boquilobo.
 
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