o riachense

Sexta,
26 de Abril de 2024
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Justiça e injustiças

FARPADAS

O ano de 2014 foi um ano em que aconteceram muitas coisas más; morreram muitos amigos meus, por exemplo. Mas também aconteceram algumas coisas boas; ainda foi possível comemorar os 40 anos do 25 de Abril com alguma liberdade... 

Tudo o que acontece pode ser considerado bom ou mau, conforme o ponto de vista. É por isso que eu considero que foi bom um antigo primeiro-ministro português ter sido preso. Porque assim as pessoas estão mais atentas à discussão do que se passa com a justiça (ou falta dela) em Portugal. Nunca há justiça a mais. Pode haver falta de justiça, mas nunca há justiça demais. A justiça é como a bondade: quanto mais melhor. A justiça é ilimitada. Mas uma coisa é a justiça, outra é a maneira como os diversos países estão organizados para implementar uma sociedade cada vez mais justa. A  organização e aplicação da justiça nem sempre é justa, por vezes é até muito injusta.

O valor mais importante das pessoas é a liberdade. Mas a liberdade não é ilimitada, acaba quando começa a liberdade dos outros. Por isso a liberdade conquista-se, constrói-se, educa-se. Para educar a liberdade dos cidadãos, a justiça pode chegar a privá-los de liberdade. Temporariamente. Para não perder a liberdade, é preciso lutar por ela todos os dias. É preciso não ter medo de viver em liberdade. É preciso assumir a responsabilidade dos nossos actos, a responsabilidade de vivermos como pessoas livres. Ser livre é ser responsável pelos seus actos.

Portugal é dos países com menor taxa de criminalidade na União Europeia, mas é o país com mais presos. Presos já condenados mas também presos preventivos.

Todos nós sabemos que os juízes se enganam de vez em quando. Nos países onde há pena de morte, por vezes descobre-se o criminoso depois daquele que foi condenado ter sido executado. Quando alguém é preso, é imediatamente julgado na praça pública. É condenado pelos seus inimigos e ilibado pelos seus amigos. É como a marcação de penaltis no futebol. É sempre injusto se for contra a nossa equipa e é sempre justo se for contra a equipa adversária. Porque a paixão e a emoção podem matar a razão. 

Para evitar que a justiça seja injusta, a organização da justiça deve tomar precauções, como por exemplo, investigar primeiro e prender depois. Só utiliza a prisão antes do julgamento quando tem provas dos factos pelos quais as pessoas são presas. Por isso, quando prende, diz quais são os factos que motivam a acusação. Quando não faz isso, a justiça é injusta. Em Portugal existem cerca de 14.000 presos, dos quais  4.000 são presos preventivos, isto é, são presos sem julgamento. Todos os países da Europa têm percentagens muito inferiores. Ainda bem que prenderam José Sócrates, para estes problemas serem discutidos. Ele também é culpado da justiça portuguesa estar como está.

Ultimamente tem-se falado muito na tortura, dizendo que em Portugal a tortura acabou com o 25 de Abril. Mas basta pensarmos só um bocadinho para vermos que a primeira das torturas é estar preso, é estar privado de liberdade. E quanto mais inocente a pessoa estiver, mais difícil se torna esta tortura. Por isso há pessoas inocentes que acabam por confessar crimes que nunca cometeram. Segundo alguns jornais, um dos 4.000 presos preventivos é um motorista que está privado de liberdade porque obedeceu às ordens do seu patrão. Se isto não é tortura, então eu não sei o que é tortura.

A justiça deve servir para ajudar a educar a liberdade das pessoas. Por isso, só deve privá-las de liberdade quando não há outra solução. Quando a justiça prende sem necessidade é porque é fraca, porque é incapaz de exercer a sua função que é ajudar a educar pessoas livres. Fazer com que as pessoas saibam e sejam capazes de utilizar a sua liberdade. E isto só se pode fazer em liberdade. Assim como não há pessoas perfeitas, também não há sociedades perfeitas, mas a nossa função, de todos nós e não só dos governos, é ajudar a melhorar a sociedade onde vivemos. Se as leis que regem a justiça não forem justas, é preciso mudá-las ou aperfeiçoá-las. Uma lei que permite a prisão preventiva de suspeitos não é democrata. Em democracia, só alguém acusado de um crime concreto pode ser preso antes do julgamento. Mesmo que a acusação esteja errada. Não pode é ser preso só por suspeitas.

Quero aqui dizer que não estou de acordo com aqueles que dizem que um antigo primeiro-ministro é um cidadão como os outros. Não é verdade. Quando um cidadão normal vai a julgamento, além dos factos concretos, contam muito para a sentença as circunstâncias atenuantes e as agravantes. Mas no caso de um antigo primeiro-ministro não pode haver circunstâncias atenuantes. Porque ele de facto não é um cidadão como os outros. É mais responsável que os outros e como tal tem de ser tratado. Se for culpado, deve ser castigado com a pena máxima. 

A luta pela liberdade é uma luta de todos os dias. A democracia constrói-se todos os dias ou então é a ditadura que ganha. Quem luta pela liberdade corre por vezes perigo de vida, como podemos ver pelos assassinatos dos jornalistas no dia 7 de Janeiro em Paris. Foram assassinados porque lutaram pela liberdade. Mas para vivermos livres tem que haver quem lute pela liberdade, mesmo com risco da própria vida. Mesmo com medo, só é livre quem luta pela liberdade de todos.

Viver em  liberdade e não defender as suas ideias, é o mesmo que cair à água, saber nadar e ficar quieto. Acaba por morrer afogado. O mínimo de democracia é votar. Pelo número de abstenções, podemos ver quantas pessoas vivem em liberdade mas não querem ser livres. Como aquelas que caem à água mas não querem nadar.

Só me resta acrescentar que todas as pessoas que apoiam a prisão preventiva de José Sócrates, têm obrigação de se apresentar como testemunhas de acusação. Talvez assim seja possível fazer a acusação que tanta gente deseja.

Actualizado em ( Segunda, 23 Fevereiro 2015 18:07 )  
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