o riachense

Sexta,
26 de Abril de 2024
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O pátio do avô Simão
1. Simão Soisa pertencia a uma dessas gerações de pescadores da Praia da Vieira que trocaram a labuta no mar pela benévola placidez do Tejo. À ilharga da lezíria, espalhando as redes ao sável.
Vida danada a do mar. " Invernos inteiros a ver o mar empinar-se, varrer tudo da frente, não largar um naco de pão para a boca de um menino (...) - Alves Redol, in Avieiros, 1942.
Por aqui ficou, habitando o próprio saveiro e, mais tarde, um casebre tosco, de madeira, erguido sobre estacas, num desvão da maracha.
A vida corria, uns dias torta, outros melhor, à proporção das safras. No último quartel da vida, tomados pelo" reumático" , Simão Soisa e a mulher Olinda decidiram aplicar o parco aforro do casal na compra de um pátio, com alguns cómodos: casa térrea, palheiro, forno e alpendre.
Ali perto, amanhavam um cerrado, pequeno tracto de terra de oliveiras e chão de outras culturas, deixa de um parente também avieiro.

2. Olinda faleceu, entretanto.
Simão Soisa foi abrigar-se no lar de uma instituição, dita de solidariedade social, cumpridas que foram algumas, aliás, breves formalidades, consistentes na doação do cerrado àquela instituição, e, bem assim, de algumas peças do magro espólio de Olinda : um cordão, um broche, uma escrava - tudo ouro legítimo - respigados numa gaveta do psiché.
Simão Soisa jamais recebeu a visita do filho, o único, que se fez cidadão do Luxemburgo. Tampouco do neto.
Simão Soisa morreu na mais aviltante solidão. E o muro do pátio que foi seu ostenta agora um painel, aliás piroso e presumido, cinicamente evocativo do velho avieiro, com os dizeres “o pátio do avô Simão” .

3. Vem a propósito referir, fazendo fé numa notícia vinda a lume na revista Sábado, de 10.03.2011, que o governo da República Popular da China lançou uma campanha visando a sensibilização dos seus nacionais para a obrigação - que se pretende instituir - da visita aos pais, nos termos e pela forma que a lei vier a definir.
Com o pragmatismo que tem sido a sua divisa, o governo chinês pretende fixar um dever jurídico de conteúdo homólogo ao do poder paternal que vigora entre nós e, presumivelmente, na sociedade chinesa.
O dever de visita, que se pretende impenda sobre os filhos, não se confunde, todavia, com o dever jurídico análogo, que flui do direito civil português: a obrigação alimentícia. Com efeito, os filhos têm, com relação aos pais, o ónus de lhes prestarem alimentos, entendendo-se por alimentos tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário.
Tal obrigação está longe, porém, de subsumir um dever, de conteúdo ético, mais amplo, que é recíproco daquele que os pais observaram para com os filhos quando os trouxeram ao mundo.
A Simão Soisa, protagonista da parábola vertida nesta crónica, não poderia, pois, augurar-se outro fim.
o autor desta crónica segue a antiga ortografia
Actualizado em ( Quinta, 07 Abril 2011 13:28 )  
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