o riachense

Quinta,
25 de Abril de 2024
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Farinha Marques

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Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada.


Uma sátira penetrante, esta que lhe ofereço, leitor, e que agora vai transcrita, vertida pela pena talentosa de António Lobo Antunes.
Lobo Antunes escarnece da frágil condição masculina, umas vezes piegas, outras pusilânime, que soçobra na emergência de um infortúnio, uma trivialíssima gripe, por exemplo.
Trata-se de uma poesia jocosa, repassada de humor, na linha da tradição galaico-portuguesa, de raiz popular, em que assentam as cantigas de amigo de estrutura paralelística.
O carácter eminentemente popular destas cantigas manifesta-se no constante apelo à repetição: as estrofes rematam sempre pelo mesmo verso que é o estribilho ou refrão.
E senão veja-se este excerto de uma cantiga de amigo, atribuída a D. gancho I e datada de 1199:

Ai eu coitada
Como vivo en gran cuidado
Por meu amigo
Que ei alongado
Muito me tarda
o meu amigo na Guarda
Ai eu coitada
Como vivo em gran desejo
Por meu amigo
Que tarda e non vejo
Muito me tarda
o meu amigo na Guarda

Esta estrutura paralelística e popular das primitivas cantigas de amigo ainda hoje está presente em determinadas cantigas que o vulgo trauteia. Um exemplo: "às quatro da madrugada o passarinho cantou" .
E sobreviveu, até aos nossos dias, em certos cantos litúrgicos. Lobo Antunes, por seu turno, não subestimou a nossa tradição poética  neste magistral poema que o leitor, por certo, não deixará de apreciar.
 
Pachos na testa, terço na mão,
Uma botija, chá de limão,
Zaragatoas, vinho com mel
Três aspirinas, creme na pele
Grito de medo, chamo a mulher.
Ai L urdes que vou morrer.
Mede-me a febre, olha-me a goela,
Cala os miúdos, fecha a janela,
Não quero canja, nem a salada,
Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada.
Se tu sonhasses como me sinto,
Vejo a morte, nunca te minto,
Já vejo o inferno, chamas, diabos,
Vejo demónios nas suas danças
Tigres sem listras, bodes sem tranças
Choros de coruja, risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes, fica comigo.
Não é o pingo de uma torneira,
Põe-me a santinha à cabeceira,
Compõe-me a colcha,
Fala ao prior,
Pousa o Jesus no cobertor.
Chama o doutor, passa a chamada,
AiLurdes, Lurdes, nem dás por nada.
Faz-me tisanas e pão de ló,
Não te levantes que fico só,
Aqui sozinho a apodrecer,
Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer.

 
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