Lisboa, uma outra parte de mim
Se há alturas em que a vida parece não andar, em que o tempo parece estagnar, outras há em que os minutos dos dias não nos chegam para tantas coisas que nos propomos fazer.
Já deixei de fazer planos há muito tempo. Tenho os grandes sonhos, aqueles que sei que um dia vou concretizar. Mas não tenho hora marcada para eles.
Multiplico os minutos dos meus dias por outros tantos para fazer as coisas que sei e gosto. Divido os meus dias entre essas coisas e as de que gosto menos, porque assim tenho o gostinho especial de fazer coisas especiais.
Não faço planos. Não sei hoje o que vou escrever amanhã.
Quis, hoje, que este dia fosse meu.
Estou em Lisboa. Tinha pensado ir depois de almoço ao Cais do Sodré, sem hora para regressar. O cais é um espaço especial para mim, que me abraça sempre e me dá paz. Costumo dizer que é o meu refúgio.
Acabei por ficar em casa. Almoçar, fazer umas limpezas, ficar deitada na cama de olhos virados para coisa nenhuma a desfrutar da companhia dos meus peluches, reais companheiros. Porque os meus 24 anos não me tiram a paixão que tenho por eles nem o conforto que me dão.
Vivo no centro de Lisboa, num bairrinho familiar e pacato, de prédios pouco altos, parquímetros por toda a parte, e ruas estreitas. Não preciso de andar muito para ter os serviços essenciais, como padaria, cafés, papelaria, farmácia, supermercado e transportes.
Embora pequeno, ninguém aqui se conhece. Autênticos anónimos durante toda uma vida.
Uma coisa boa deste sítio pequeno e despercebido do centro de Lisboa? Acabei neste momento de assistir a um “concerto” de piano de alguém que está num prédio aqui perto. Sem grandes preocupações, tocava algumas notas soltas; parecia que a melodia se ia formando à medida que os dedos iam tendo vontade de pisar esta tecla ou aquela.
Gosto. Gosto muito! Não ter de seguir uma partitura, poder pintar uma tela de forma livre, desinteressada e quase inconsciente.
Naquele momento aquela pessoa foi livre. E eu fui livre com ela!
