António Mário Lopes dos Santos

nuno Opinião
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Não sei meus filhos que mundo será o vosso (Jorge de Sena)

Não há como um bom verão português para acabar com as vozes discordantes do poder. Regressa-se a banhos, isto é, ao melhor dos mundos. O lisboeta tem as praias da linha e da Caparica à mão, e transportes públicos para as ligações. As povoações do litoral, uma costa extensa, muitas praias, fazem das tripas coração, o mar ainda não foi adquirido pelos árabes, chineses, angolanos ou brasileiros, o corpo agradece o sol, o sal, a sardinha, a sarda, não se abuse que o cancro espreita. O interior fica a ver navios, isto é, não passa das piscinas clorozadas, que outrora, safavam-se os jovens de então a que pertenci nas praias fluviais dos rios, quando as águas não recebiam os efluentes das indústrias poluidoras. Bebem-se nas esplanadas umas cervejas geladas acompanhadas por um pires de caracóis marroquinos, os mais velhos entretêm-se na pasmaceira do tempo nos bancos à sombra dos jardins, sem grandes conversas que o coração acelera facilmente, sonolentos e inertes, na submissa aceitação do peso das placas do calor, indiferentes aos grandes cartazes publicitários dos candidatos à autarquia, que os vigiam, quando mudam de sombra, no apelo mudo dum sorriso plastificado, que não passou pela sopa dos pobres das cantinas sociais. 

Inquiro, por desfastio, esses apelos cujos olhares me seguem numa promessa implícita dum futuro mais risonho e fico-me a pensar em como a desvergonha destes aprendizes de feiticeiro os coloca no papel de lustro numa pose de modelo duma revista de gente colunável, limpos, felizes, saudáveis, a vender-nos a banha da cobra salvífica dum tempo sem neblina. 

Não sei quanto custa uma campanha, mas, partindo da sede do candidato socialista, no antigo café Império, no coração da cidade, passando pelo mercado concelhio e entrando na freguesia da Brogueira, fiscalizam-me três grandes e diferentes cartazes, dois com a família camarária, diferentes na pose e na disposição, um (ou mais?) do candidato presidencial (mais um perigo nas perigosas rotundas locais), todos numa boa como se três meses de férias numa praia do Algarve fossem o resultado do esplendor fotográfico. 

Não sei quanto custa, repito, uma campanha, que, como alguém já reparou, é desigual nos meios, mas creio que, quem vir estes cartazes, se pensar no desperdício que por aí vai em fotografia para cidadão ser levado, num momento em que todos andam com o microfone da crise a gritar-nos aos ouvidos, para que não se reaja quando, quais ladrões de estradas, nos apontam com o lança-chamas da Troika, ou o postal das finanças, exigindo a bolsa ou a vida, não deixa de os mimosear com alguns palavrões bem embebidos na raiva cada vez mais explosiva.  

Se o PS se diz de esquerda, e quer resolver os problemas das populações, com estes cartazes de luxo ofensivo apenas informa que os seus objectivos nada têm a ver com os reais problemas concelhios ou das pessoas que aí vivem. Creio que no concelho inteiro, nas freguesias que foram destruídas pelos autarcas do PS, o mesmo tipo de cartazes apela ao voto autárquico no final de Setembro. O dinheiro que se gastou apenas significa o desprezo que merecem os que têm meses com dias a mais para a realidade da fome e as contas da luz, da água, dos remédios, dos impostos, que a pouco e pouco foram abandonando os pequenos luxos de que os vampiros das finanças e da banca e seus acólitos os acusam de terem sido perdulários.

Não sei qual a pasta de dentes que lhes dá aquele brilho de esmalte de felicidade, e se António Seguro considera que está certa a campanha (o programa ainda nem se conhece, a não ser a entrevista do candidato a presidente, com o mesmo programa do despesismo e da dívida de António Rodrigues) do PS local, pode ter a certeza de que a ideia que se faz da sua política para as autarquias não é melhor do que a que se pensa da de Passos Coelho e Paulo Portas.

O PS local não fez outra coisa, em vinte anos, que uma política de fachada com os resultados que aí estão à vista. O que se promete, pelos vistos, é mais do mesmo.

 14 de Agosto de 2013 

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António Mário escreve sempre às quintas-feiras em www.oriachense.pt 

Actualizado em ( Quarta, 21 Agosto 2013 23:05 )