António Mário Lopes dos Santos

nuno Opinião
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Mais vale prevenir que remediar

 

É cedo, mesmo muito, para uma análise da composição do novo executivo camarário. É tudo, em maior ou menor grau, gente conhecida. Os conteúdos dos discursos de apresentação, por detrás da parafernália informática, desencadearam-me, perdoe-se-me, um longo bocejo. Não se vislumbram, ainda que o rei esteja, de momento, de forma aparente ou real, fora do baralho, grandes mudanças que o vice-rei apresente. As reuniões mantêm-se quinzenais, uma pública, a segunda privada. Significa que, sem contar férias, faltas de quórum, outros acidentes, se projectam 26 reuniões públicas durante um ano civil, guardando-se as outras 26 para reuniões privadas, porque, como lembrou o actual presidente Pedro Ferreira, «existem processos que requerem alguma discrição, por estarem pessoas e instituições envolvidas e que haverá necessidade de reflectir e discutir sem presença de público». 

Desde que conheço a história da instituição autárquica, do século XVIII  aos nossos dias, só na gestão socialista de António Rodrigues se inaugurou essa teoria das reuniões privadas, bem pouco explicativas da verdadeira essência da sua manutenção. O acto executivo camarário, por essência, é público. Se há assuntos a discutir em privado, fazem-se reuniões extraordinárias privadas, mas não com carácter deliberativo. Como vereador, participei em reuniões, visitas, trocas de opinião com os outros grupos partidários, mas nunca assumi qualquer deliberação fora de sessão pública, que exige acta e se encontra sujeita a escrutínio, pelo menos, não só dos vereadores, como das presenças testemunhais presentes. E na altura, até da Rádio Local, que, então, não domesticada por valores que a razão desconhece, transmitia as sessões em directo. O que, localmente, se iniciou com a gestão de António Rodrigues permitiu todas as cedências a troco de algo, que prejudica e minimiza muito mais os partidos da oposição, minoritários, dos que, com o poder da maioria absoluta, cozinham antecipadamente com os interessados as propostas e os projectos depois assumidos por toda a vereação. 

Investiguem-se os exemplos destes vinte anos aprovados em sessões privadas, que deveriam colocar as oposições numa posição de irredutível intransigência. Sessões privadas de interesse público não serão sessões pseudo-públicas de interesses privados?

Não estranho que o Henrique Reis tenha proposto sessões semanais e todas públicas, e a sua proposta derrotada. Mas gostaria de saber qual a votação do CDU e do Bloco de Esquerda, que a imprensa omite. Ou, se não houve votação, qual a sua posição.

Como cidadão e ex-vereador, não participaria em sessões privadas - não votei para conluios secretos – e defenderia as sessões públicas semanais, que sempre foram tradução da democracia social, da 1ª república e da que se instalou como 25 de Abril, apenas alterada com a gestão PS. 

Se houve cedências dos partidos da oposição no passado, quem cedeu que apresente os ganhos públicos dessa cedência. Sem transparência, a democracia transforma-se num jogo de interesses partidários, onde as alternativas se restringem a jogadas de bastidores. Ainda não há uma semana, na página electrónica deste jornal, me insurgi contra o negócio do PS e da CDU sobre a junta de freguesia agregada de S. Pedro-Ribeira-Lapas, com prejuízo da lista de independentes e total repúdio do Bloco de Esquerda. Não é este tipo de política que abrirá caminhos no futuro, e estou plenamente convencido que os partidos actuais, ou se abrem, ou transformam-se em vasos de flores de plástico ornando sessões comemorativas de efemérides, onde cada vez mais as cadeiras, em cada ano, pela lei do tempo, não encontram ocupantes. 

Daí que me custe verificar, na informação que me chega do novo executivo socialista, que, para além dum tempo que lhe é desfavorável e deficitariamente muito complexo, assente não apenas na manutenção de quatro vereadores a tempo inteiro com o monopólio de todos os pelouros camarários, com todos os privilégios e benfeitorias que dai advêm, e as dívidas que suportamos, como a aceitação deste estado de coisas pelos três partidos da oposição, sem um repúdio imediato, desde a primeira sessão, de vinte anos de total descaminho político que deveriam ser obrigatoriamente explicados numa sindicância externa.

Quando da leitura da imprensa começa a sobressair das reuniões autárquicas a palavra consenso, temo que o concelho de Torres Novas não ultrapasse o casulo da mediocridade onde há décadas o empreendorismo da especulação o mergulhou. É que consenso é algo de muito sério, com que se não brinca, porque morde e queima quem o usa de modo indevido. E fico a aguardar, ainda que com muito cepticismo, o cumprimento dos programas que os partidos de esquerda apresentaram na campanha eleitoral, com os quais foram eleitos.

4 de Novembro de 2013 

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António Mário escreve sempre às quintas-feiras em www.oriachense.pt 

Actualizado em ( Sexta, 08 Novembro 2013 11:26 )