Luís Pereira

Quarta, 09 Março 2011 15:25 Opinião
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  Renascimento

 


O dia 19 de Outubro de 2009 vai ficar registado como o dia do meu renascimento. Ontem cerca das 7 e meia da manhã, dirigia-me eu, mais o Rafa, para o Oued Garfa, onde estamos a construir uma ponte, quando tudo sucedeu. O que se segue durou cerca de um segundo. Poderei dizer que se tratou de um segundo interminável. Já muitas vezes ouvira dizer que em determinadas situações, a vida, nos passa toda pela frente, em poucos momentos. Pude confirmar que tal facto infirmei.
Dizia então que me dirigia a Garfa, ao chegar ao cimo de uma lomba da “estrada” deparo-me com um “monstro” branco, que velozmente se dirigia contra mim. O tal monstro era um Toyota Land Cruiser, transportava onze pessoas no seu interior mais cinco no tejadilho. Bem como toda a bagagem desses viajantes. Eu encontrava-me na minha mão, o problema era que o monstro também… A minha cara não sei como aparentava, embora imagine, a do condutor do monstro era de puro terror. As dos passageiros do tejadilho, essas então eram de meter medo. Consegui observar todos os pormenores do monstro. Lembrei-me dos meus filhos em Portugal e de como estava iminente um fim inglório para a minha estada aqui. Vi perfeitamente o acidente que ocorreu. Vi os meus avós a olhar para mim. Percorri os factos ocorridos nestes últimos anos e que me trouxeram até à Mauritânia. Vi-me ainda pequeno a brincar em casa dos meus pais. Vi a grelha do monstro a rir-se de mim. Um branco que encheu todo o campo visível. Senti cada músculo do Rafa a comprimir-se. Pensei, “Então é assim que tudo acaba”. De repente o monstro ataca os últimos metros em duas rodas, inclina-se para a esquerda, duma forma que só podia acabar num tombo. De repente o tempo estica-se e tenho o carro parado, estamos inteiros. Estou cansado. Custa-me a respirar. Olho para trás e vejo o monstro a voltar à verticalidade. Volta às quatro rodas. Imobiliza-se também. Está a cerca de cem metros de mim. Percebi que continuo neste mundo. Tenho um nó na garganta. Falar está a revelar-se difícil. Engreno a primeira e parto para Garfa. Ouço o Rafa dizer que temos vidas como os gatos. Ouço-me a responder, que isso é bom, mas se ter vidas de reserva é bom, gastá-las não é bom…