Mária Pombo

Quinta, 06 Outubro 2011 14:36 Opinião
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Andorinhas


Gosto de aves. Gosto muito. Vejo nelas uma liberdade imensa que nos falta a nós, seres humanos, e que apenas artificialmente a conseguimos sentir.
Gosto de andorinhas. Sei que esteticamente há animais muito mais belos, mais fortes, mais atractivos. Gosto de andorinhas pela sua simplicidade, pela sua audácia, por me darem o prazer de as vislumbrar nos finais de tarde de Verão, por me darem os “bons dias” logo cedinho e me lembrarem que o calor me espera e o Sol já chama por mim.
Usamos tantas vezes a expressão “cabeça de andorinha” para chamar distraído a alguém – quantas vezes dou por mim no mundo da lua, a pensar em coisas que não passam na cabeça do menino Jesus? – que até nos esquecemos de que as andorinhas conseguem alimentar as suas crias no ar, sem precisarem de pousar no ninho, e que são animais extremamente ágeis.
Gosto de andorinhas também pela sua coragem, por não se deixarem acomodar num lugar, por procurarem sempre os sítios que as deixam mais confortáveis e mais seguras. E admiro-as por isso.
Este ano tive o prazer de as ver fazer aquilo a que chamamos despedida. Aquele bailado ao nível dos telhados das casas, longo e sem abrandar, talvez numa tentativa de dizerem “até para o ano” aos ninhos que deixaram para trás. Indescritível.
Já nós, humanos, somos animais de hábitos. Fazemos coisas tantas vezes porque sim, ficamos porque é um risco partir e porque é chato levar tudo. Não importa se temos sonhos, se não suportamos o frio ou se estamos desempregados. Ficamos apenas, na esperança de que cheguem os dias melhores. Ficamos porque não nos queremos aborrecer com terrenos movediços. Porque é muito mais fácil apontar o dedo a quem foi e teve de regressar, e é muito mais simples queixarmo-nos de tudo e de todos.
As andorinhas não. Os materiais, para elas, são algo secundário; o que importa mesmo é manterem a salvo as suas crias e correrem atrás do calor, que as faz felizes.
Há animais mais bonitos, mas de que lhes serviria a beleza se precisam é de agilidade? De que me serve a mim um belo corpo se não tiver o cérebro a controlar as minhas palavras e a orientar as minhas atitudes?
Agora, se me dão licença, vou só ali fechar os olhos e sonhar mais um bocadinho… E se perguntarem por mim, digam que estou a voar!