As discussões e as confusões

Quarta, 10 Julho 2013 10:22 André Lopes
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Imaginemos a vida em Riachos, como ela parece ser vista pelos olhos de alguns dos principais protagonistas da nossa vida pública: na próxima Festa da Benção do Gado, o envolvimento de todos nós vai ser temperado pela apreciação de podermos estar a contribuir para as aspirações autárquicas da CDU, alguém, pela mesma razão, poderá começar a pensar comprar um balde de tinta branca para apagar as pinturas feitas pelo NAR nas paredes das ruas da vila, na Festa do Padroeiro apenas estarão a bater palmas e a comprar rifas os apoiantes do PSD, vamos todos pensar duas vezes antes de pagar as quotas do Atlético, não vá o êxito do clube ser aproveitado a favor do PS...
Se a um leitor distraído este absurdo pode parecer inconcebível, não nos parece que esse mundo esteja assim tão distante, a avaliar pelas reacções dos nossos políticos locais, de recusa ao convite para participarem no debate do filme do João Luz, com o pretexto que tal apenas serviria para dar força à candidatura do BE à Junta, dada a presença do realizador como cabeça de lista desse partido nas próximas eleições locais.
Esclarecendo posições: quando João Luz surgiu com a ideia de fazer um manifesto em forma de filme que funcionasse como resposta ao auto-elogio de Rodrigues, mostrando o estado de desolação e falsas promessas a que os últimos vinte anos reduziram Riachos, isso não só nos pareceu uma excelente ideia como desde logo também nos pareceu que justificava uma apresentação e debate públicos, que dessem ainda mais força à denúncia pretendida.
O facto de João Luz ter, entretanto, assumido uma candidatura partidária à Junta, no nosso entender em nada diminuiu o valor do seu trabalho nem da sua intenção, mantendo-se o riachense como parceiro neste projecto, que continuou a ser prosseguido e apresentado como um projecto pessoal, não como uma iniciativa eleitoral do BE. 
Evidentemente, não temos falsas ingenuidades. Claro que a candidatura de João Luz alterou consideravelmente os pressupostos iniciais, quer quanto ao alcance potencial da divulgação e discussão do seu filme – como, infelizmente, se verificou - quer quanto à possibilidade do seu aproveitamento partidário, sobretudo em fase de pré-campanha eleitoral. Não pretendemos esconder essa situação, pelo contrário, referimo-nos abertamente a ela no nosso último editorial. Mas só se achássemos que teria havido aqui alguma intenção conspirativa do seu autor – o que, naturalmente, nem percebemos como pode ter passado pela cabeça das pessoas – ou que tudo o que tenha alguma ligação partidária passa logo a ter lepra ou faz desaparecer instantaneamente o valor que as coisas podem ter é que nos faria recuar na oportunidade de promover um debate público acerca de Riachos, dos constrangimentos que temos atravessado e das iniciativas que podemos ter para os ultrapassar, com o contributo de vozes plurais e diferentes perspectivas, evidentemente se para aí as pessoas estivessem viradas.
Evidentemente, sem deixarmos de respeitar a decisão de cada um e a estratégia eleitoral que cada lista ou partido entendeu ser a mais indicada para os seus propósito.
Mas recusamos que esta colaboração com João Luz tenha colocado em causa a isenção e objectividade d’ o riachense, um dos valores que mais pretendemos preservar, e que não confundimos com ausência de espírito crítico, de abertura mental e de disponibilidade para a colaboração construtiva. Pelo contrário, a isenção e a objectividade medem-se, precisamente, pela nossa capacidade de tomar posição, de dar atenção às várias visões do  mundo que localmente se podem encontrar, pela vontade de fazer parte de uma construção colectiva que não anule autonomias nem se deixe enredar em indiferenças pelo palpitar dos corações.