Riachos, terra de imigrantes

Quarta, 07 Maio 2014 11:35 André Lopes Somos todos primos
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Carlos Manuel Pereira
Era uma vez um homem que vivia no Casal do Riacho

Quando em meados do século XVI o tal Afonso Fernandes, Riacho de alcunha, escolheu o sítio dos Casais dos Riachos para se fixar, estávamos num tempo em que era muito vulgar aparecerem nos registos paroquiais referências a escravos. Em cerca de quatro décadas aparecem, apenas na freguesia de Santiago, dezenas de registos em que são mencionados escravos, mais especificamente referindo baptismos de filhos de escravas. Nos tempos em que a localidade nascia, ali ao lado na quinta da Várzea, era vulgar a menção a escravos. No caso do Afonso Riacho apenas existem referências a criados. É claro que a designação de criado servia perfeitamente para designar aqueles que eram libertados da escravatura e que continuavam a servir os mesmos senhores. Até ao século XX era vulgar chamar criados aos indivíduos que trabalhavam toda a vida para o mesmo senhor, por exemplo nas quintas à nossa volta. Não sendo escravos, de facto, estavam ligados à casa onde trabalhavam como se isso fosse “da sua natureza”.
 
Porém tudo parece indicar que o espírito existente nos casais dos Riachos fosse convidativo para indivíduos que esperavam encontrar um lugar onde pudessem trabalhar livremente e, como alguém disse, se o que faz uma localidade é o local e o local é generoso de recursos, então as pessoas acabarão por chegar e a localidade irá prosperar. Era tempo de imigração.
 
Nos séculos XVI e XVII os primeiros imigrantes são, na sua maioria, naturais de lugares do próprio concelho, por exemplo, Brogueira, Alcorochel, Minde, Carreiro da Areia, Árgea, Lamarosa, Assentis, Gateiras, Valhelhas, Zibreira ou do corpo da própria vila, ou de concelhos vizinhos (Tomar, Chamusca, Golegã, Azinhaga, S. Vicente do Paúl, Atalaia).
 
A partir dos finais século XVII começam a aparecer famílias de alguns concelhos mais distantes (nomeadamente Ourém, Leiria, Pombal, Penacova, Soure, Ansião, Penela) que, por ligação às já existentes no Espargal, deram origem a esta profusão de primos e delas se seguem alguns exemplos (vão indicadas as datas aproximadas da sua chegada aos Riachos e o número dos seus descendentes aqui nascidos até 1910):
GOMES (1670) – provavelmente da vila de Torres Novas, com mais de 1800 descendentes.
 
GOMES dos SANTOS (1700) – provavelmente da vila de Torres Novas, descendentes 1270.
MARQUES (1700) – Casével, descendentes 1060. Apesar do notável número de descendentes, nenhum usou este apelido porque este José Marques de Casével apenas deixou filhas.
NUNES (1700) – Marmeleiro, freg. Madalena, Tomar, descendentes 1180. Os MAURÍCIOS são um ramo destes Nunes. Os MATOS também são descendentes destes Nunes, por via do apelido duma Margarida de Matos que veio de Almeirim e casou com um Martinho Nunes. 
AZEVEDO (1740) – Vieira do Minho, Braga, descendentes 520.
AMADO (1750) – Alqueidão da Serra, Porto de Mós, descendentes 380.
BARROSO (1760) – vieram das Marruas duas filhas de um tal Damião Barroso, descendentes 680.
CHORA (1820) – vila de Torres Novas, freg. de S. Pedro, descendentes 100.
MARQUES (1820) – Leiria, descendentes 50.
Pela curiosidade, a seguir vão outros casos de apelidos por alguma razão mais populares:
LUZ (1760) – Pombal, descendentes 170. A primeira geração de Luzes nasceu nos Casais dos Castelos.
DUARTE, gaiteiro (1770) – vieram de Vinha da Rainha, Soure, descendentes 100.
ANTUNES BARROSO (1800) – vieram das Marruas, descendentes 120.
PAULA (1830) – vieram da Lamarosa, descendentes 120.
REMÍGIO (1840) – são descendentes de um Remígio Oliveira que veio de Paialvo, descendentes 60.
BARROCA (1850) – descendem de um Manuel Jorge que veio de Cadima, Cantanhede e que casou com uma Maria da Guia, natural da Barroca (a localidade passou a apelido), descendentes 30.
SARAIVA (1870) – vieram de Pena Verde, Aguiar da Beira, descendentes 15.
 
Até à primeira metade do século XX, antes de ser introduzida a mecanização na agricultura, era usual a grande movimentação de pessoas que, vindas dos concelhos a norte, procuravam trabalho na zona das lezírias do Tejo e depois, naturalmente, quando calhava encontrarem “parceiro”, por aqui ficavam… 

Actualizado em ( Terça, 27 Janeiro 2015 23:03 )